Deputadas repercutem os 90 anos do voto feminino no Brasil

No dia 24 de fevereiro de 1932, um decreto do então presidente Getúlio Vargas abria uma importante página na história brasileira: a permissão para as mulheres exercerem o seu direito de voto. Nessa data, foi sancionado o primeiro Código Eleitoral, que garantiu oficialmente às mulheres acima de 21 anos os direitos de votar e de serem votadas no Brasil.

São 90 anos de uma conquista que fortaleceu a luta das mulheres brasileiras por igualdade de direitos. Mas ainda existem muitos obstáculos que precisam ser enfrentados, principalmente nos espaços políticos. Mesmo sendo maioria – elas representam 53% do eleitorado no Brasil, com 77 milhões de eleitoras aptas a votar – a presença delas na política é baixa. A Assembleia Legislativa de Santa Catarina é um exemplo. Dos 40 parlamentares, seis são mulheres.

A Agência AL ouviu deputadas estaduais catarinenses sobre os 90 anos do voto feminino, o que isso representa para as mulheres brasileiras e o que ainda precisa ser conquistado.

Ada de Luca (MDB):
Há muitos anos, quando sequer exercia cargos eletivos, já percorria o país pelo partido, dando palestras com o tema “Mulher politizada é Mulher valorizada”, buscando estimular a participação feminina não só na política partidária, mas nas mais diversas áreas. A legislação garante o preenchimento obrigatório de 30% de candidaturas do sexo feminino, mas isso ainda não é o bastante.
Por isso eu reforço coro com campanhas como a “Meu voto é delas”, para que mulheres votem em mulheres, garantindo assim a tão sonhada representatividade, e que esta representatividade seja refletida nas mais variadas áreas, que de forma costumeira geralmente são ocupadas por homens. Tenho convicção de que uma sociedade mais democrática passa pela participação de mais mulheres nos espaços de poder. Vivemos ainda num momento onde somos assolados por altos números de feminicídio, e mudar isso só será possível tratando a sociedade como um todo e rompendo com a cultura do machismo, que é estrutural.
Eu sonho com um dia em que mulheres ocupando espaços de destaque não precisem mais ser comemorados, pois são cenas corriqueiras no dia a dia. Esta é a minha luta de vida e enquanto tiver forças, seguirei trabalhando por isso.

Luciane Carminatti (PT):
Sem mulheres na política, não há políticas públicas para as mulheres. Portanto, precisamos nos construir enquanto lideranças e referências, para ter voz ativa nas ações que decidem os rumos políticos de nossos partidos, setores, cidades e país. A política é um meio extremamente intimidador para as mulheres, pois somos lembradas com frequência que ocupamos posições historicamente construídas por e para homens. Mas não é abandonando esses espaços que vamos reduzir as desigualdades. Devemos participar, concorrer e ocupar o campo político para ter mais força e avançar nas conquistas sociais pelas quais tanto lutamos. É necessário estabelecer em cada município e em Santa Catarina o “CPF” das políticas para mulheres: conselhos, planos municipais e estadual, e finanças. Sem esses três mecanismos, ficaremos a “enxugar gelo”.
Precisamos de robustez para vencer os desafios diários que enfrentamos, no campo e na cidade, em casa e no trabalho, na liderança das comunidades e nos poderes legislativos. Toda vez que uma mulher se defende, sem nem perceber que isso é possível, sem qualquer pretensão, ela defende todas as mulheres. Acredito muito nessa convicção, que é da Maya Angelou, uma mulher negra que fez história com sua existência e resistência, como tantas de nós, cada uma em suas realidades.

Marlene Fengler (PSD):
Nós temos muitas conquistas a celebrar. Nós temos que homenagear as mulheres que nos antecederam, que conquistaram espaços para nós, mas ainda tem muita coisa que precisamos trabalhar para conquistar.
Eu sempre faço questão de dizer também que precisamos da garantia de espaços  como, por exemplo, as cotas. Não deveríamos, mas ainda precisamos delas, pois se os espaços de poder devem ser espelhos da sociedade, então fica muito evidente que ainda existe uma disparidade, uma diferença muito grande. Então, se as diferenças existem, nós precisamos de cotas durante determinado tempo para mudar essa realidade.
Mas, além disso, eu também acredito que, nós, mulheres, também precisamos fazer a nossa parte. Nós precisamos participar, nós precisamos pagar o preço. Não é fácil, é difícil, muito difícil. Mas esta é uma responsabilidade que a gente tem e principalmente nós, que já conquistamos esse espaço, estamos aqui para defender políticas para as mulheres, garantir seus direitos, e também para sermos exemplo e inspiração para outras mulheres participarem.
E acho que, talvez no contexto todo, esse seja o nosso papel mais importante, inspirar outras mulheres, mostrar para elas que é possível, sim, e que não só é possível, é necessário. Por que senão não adianta ter leis se não ocuparmos esses espaços tão importantes para mudar a realidade das mulheres e também do Brasil.

Paulinha (sem partido):
Primeiro, eu acho que o ponto de partida dessa conversa tem que ser esse reconhecimento. Existe um movimento negacionista, antifeminista, que não entende o que é o feminismo, que acha que ser feminista é não se depilar, é ser a favor do aborto, trazendo outros conceitos que não têm nada a ver com a pauta, e eu falo isso porque essas mulheres que ocupam os espaços agora só estão aqui porque mulheres, lutaram muito no passado para que a gente pudesse ter o direito de voto, conseguir ser votada, e hoje em dia a gente ainda tem muitos paradigmas a vencer. Uma reflexão que eu sempre gosto de fazer quando a gente toca nesse tema da participação da mulher na política é análise do esquadro do que a própria Alesc oferece hoje. Nós temos um programa Parlamento Jovem. Vou te dizer que 90% dos aprovados e inscritos no Parlamento Jovem são meninas, nessa fase de 15 a 17 anos. E à medida que a mulher vai acessando a vida adulta, vai sobrando muito menos tempo para os sonhos dela, porque ela assume os sonhos dos demais.
A mulher vem preparada pela sociedade para renunciar. Ela começa a namorar, ela casa, tem filhos, estuda, mantém um trabalho ativo hoje. Mas o horário noturno é para cuidar do bebê, para cuidar da casa, e a política é avassaladora. Quem realmente tem compromisso e trabalha pela sociedade, sabe que não dá para trabalhar oito horas por dia.
A gente tem muitas conquistas ainda pela frente, mas a reflexão que eu quero deixar é que se você sente que tem um pedacinho do teu coração que pode se dispor a ajudar, tens que vir. O país que a gente sonha, com mais amor, justiça, um país mais fraterno, não vai acontecer enquanto a gente não se envolver de verdade.
Acho que a presença da mulher nesse momento é muito importante. Estamos vivendo períodos estranhos, tensos, de muita intolerância, e as mulheres, no geral, são mais resilientes. A gente dá conta do recado. Dá pra cuidar da família e também dos nossos sonhos pelo coletivo.


Daniela Legas
AGÊNCIA AL